A escassez de contêineres, problema que vem sendo enfrentado desde o primeiro ano de pandemia, tem interferido nos embarques de vários produtos. Para atender aos contratos em tempo hábil, cafeicultores de Minas Gerais estão buscando alternativas. Uma delas é o embarque break bulk, alternativa que estava em desuso pelo setor cafeeiro há mais de 30 anos. Nessa modalidade, são transportados grãos de café embalados em big bags de cerca de 1,4 tonelada no porão do navio. A modalidade vem sendo utilizada apenas em situações emergenciais e visa a manter o abastecimento dos compradores do grão mineiro.
De acordo com o membro do comitê de logística do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) e gerente administrativo de exportação da Cooperativa Regional dos Cafeicultores em Guaxupé (Cooxupé), Ronald Moraes, com a pandemia e a escassez de contêineres, os exportadores resgataram, mas também modernizaram, o break bulk.
“Há cerca de 30 anos, o break bulk era a modalidade de exportação do café. Agora, o processo foi atualizado e está sendo usado como alternativa. Nas últimas décadas, os contêineres passaram a ser mais utilizados pela grande praticidade, mas a falta de espaço em navios e a redução pontual de contêineres fizeram com que a modalidade voltasse a ser uma opção”.
Entre as vantagens do processo está a garantia de embarque e de recebimento do produto, o que é essencial para atender aos contratos já firmados.
“A vantagem é que o exportador pode entregar uma grande concentração de carga que irá embarcar no mesmo navio. Assim, o cliente tem garantia de que o embarque vai acontecer e chegará ao destino no prazo acordado”.
Apesar de ser uma alternativa para os embarques, os desafios são grandes. Entre os principais, está a necessidade de um planejamento logístico criterioso e eficaz.
Enquanto o embarque do café em contêineres acontece de forma fracionada, em vários navios e dividido por semanas, na exportação a granel e feita no porão dos navios, o embarque é total e, por isso, quando o navio chega, a carga deve estar totalmente pronta e liberada.
“No break bulk o café é embarcado em lotes no mesmo navio, com isso, a carga tem que estar no terminal bem antes da chegada do navio. Além disso, todo o desembaraço aduaneiro deve ocorrer previamente. É preciso estar com tudo pronto porque só terá um navio, não tem outra alternativa. Os custos, caso a carga atrase e o navio fique parado esperando, são muito altos e cobrados por dia. Por isso, a logística tem que ser aprimorada e muito bem assistida”, explicou.
Em relação aos custos da operação, os mesmos são mais caros, por isso, a adoção do processo acontece em casos emergenciais. Moraes explica que a operação é mais cara devido ao maior manuseio dos bags de café. Os embarques dos exportadores do Brasil são feitos em bags de 1 tonelada até 1,4 tonelada.
“As bags são colocadas em caminhões e vão para o terminal portuário. Lá são retiradas do caminhão e colocadas em armazéns. Depois, são novamente transportadas por caminhões e colocadas no costado do navio para serem içadas e armazenadas. O processo exige manuseio constante, o que torna o custo mais caro. Por outro lado, o afretamento tem preço mais competitivo do que o embarque em contêineres”.
Mesmo sendo mais oneroso e exigir mais cuidados, o sistema ajuda a manter o fluxo de exportação, o que compensa. “A operação é mais onerosa, mas atinge o objetivo, que é atender o cliente. O exportador garante que o contrato será atendido e que o cliente terá o café para tomar no seu país”.
Inspeção
Outro ponto de atenção que deve ser considerado na escolha do método é a inspeção no navio antes do embarque da carga. Antes mesmo de atracar, o navio deve ser inspecionado por empresas especializadas, que irão avaliar se o porão está livre de odor, limpo, sem nenhum tipo de sujeira ou obstrução.Também são avaliadas as tampas dos porões e realizados testes de estaqueamento para não entrar água da chuva ou do mar.
“Para que o processo ocorra de forma correta e para a preservação do café embarcado, uma equipe de inspeção acompanha as operações desde a armazenagem até a colocação do café a bordo do navio. Os navios precisam estar em boas condições, sem odores, e os porões devem estar limpos para não alterar a qualidade do café”.
Em Minas Gerais, uma das cooperativas que aderiu ao processo é a Cooperativa Regional dos Cafeicultores em Guaxupé (Cooxupé), localizada no Sul de Minas.
“A cooperativa realizou quatro embarques nessa modalidade, sendo que dois foram completos – com cafés da Cooxupé ocupando todo o porão do navio – e outros dois de forma fracionada junto com outras cooperativas exportadoras. Entendemos que essa seja uma alternativa para manter as exportações”, explicou Moraes.
O consultor da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil/Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (CNA/Faemg) para o Agro em Minas Gerais, Ricardo Abreu, explicou que a alternativa para o embarque do café tem sido adotada somente em casos emergenciais. A tendência é que o processo seja descontinuado assim que a oferta de contêineres volte a atender, de forma eficaz, ao setor.
“Esse tipo de embarque, a granel e feito no porão dos navios, funciona muito bem para o milho, ureia, soja e vários tipos de mercadoria que são menos sensíveis. No caso do café, o produto é muito sensível, pega cheiro, não pode molhar, então esse tipo de embarque não é muito apropriado. Até o momento, foram em torno de cinco embarques usando o sistema de big bags”.
O embarque via break bulk também é considerado complicado pelo fato de o café não ser homogêneo, variando entre arábica e conilon e com notas de qualidade diversas.
“A carga não pode misturar, isso dificulta. Se um café especial se misturar, o exportador perde dinheiro. O break bulk não é um embarque adequado. Por isso, em termos de perspectiva de mercado, não acredito que vai ter continuidade. Ele vem sendo usado como emergência”, disse Ricardo Abreu.
Fonte: Diário do Comércio